UMA EXPERIMENTAÇÃO POÉTICA DE LUZES DA TUA LUZ DA TUA PALAVRA DA TUA VOZ SOMANDO-SE MULTIPLICANDO-SE NA ILUMINAÇÃO DA GRANDE PIRA. POESIA SEMPRE ACESA NA ESCURIDÃO!
domingo, 27 de dezembro de 2009
AMANHECENTE
Lilian Reinhardt
Queria passear de mãos dadas
com a palavra sem conceitos
queria transformar as pedras
em colméias
e gritar a Deus no céu do trovão
que o menino é sempre passarinho
e dá de beber na janela do mundo
a todos os versos
até embriaga-los para
acordar como Manoel de Barros
as cores do amanhecer
acordar as águas das fontes
revigorar os pés cansados dos montes
e calçar-lhes novas sandálias
para não tropeçar no zênite
levitar sobre a nomenclatura dos vermes
que esgarçam a palavra
no frenesi dos abismos
dizer da alvura das tempestades
além da escuridão
da gravidade da luz
em todas as idades
dar de beber ao cântaro
carregado de ansiedades
que fermenta as leveduras do chão
e sempre sorver de água fresca de verbos
recém –colhidos
queria assim...
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
DA VARANDA DO BANGALÔ DA RUA ALAGOAS
pintura/Bracher
(Memoriais de Sofia/Zocha)
Lilian Reinhardt
Da varanda do bangalô da rua Alagoas
de piso de cimento
com pó vermelhão espelhado
que a mãe lustrava com vasourão
por entre as floreiras altas
muralhadas e salpicadas
de malvas caídas pelos beirais de concreto
via-se o pequeno jardim de cravos
onde rodopiavam as silvosas margaridas
girasolos embecidas
enquanto ouvia-se o estrondoso ruído
do fim do mundo quando passava o trem
na quadra de cima da Vila G
depois da árvore do enforcado
rumo à Araucária das roseirais.
Como tremia o chão!!!!
Passava como um rio desesperado
destravancado de sua guarnição
um vulcão pustulado qual dragão ferido
esquecendo que sob a beiral de seus trilhos
levava consigo uma revoada de moradas simples
como a de dona Anita
e seu João carpinteiro crente
de Edília de Maria
que faziam brilhar as panelas sob o chão de
barro da cozinha de cada dia
Não se via brilho igual de constelação luminar
enquanto o trem passante com suas asas
revoava insano
entre partidas e chegadas
e desfiava suas linhas em curvas e madrugadas
sob os dias e noites dos meus olhos
que ainda petalavam levedavam...
óleos sacros de caramanchão!
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009
A CANÇÃO DO RIO
foto/Lilian Reinhardt/Guaraqueçaba/PR
CLAUDIO BENTO
Descamba o rio em seu delírio
depois de inventar nascentes e minadouros
demarcar seu curso
lamber praias e barrancas
adentrar suas ilhas
suas ilhotas rodeadas de silêncio e pedras
descamba o rio em seu delírio
em sua desvairada sonata de correntes correntezas corredeiras
sua canção de peixes
suas lavadeiras
sua Yara de cabelos pretos de índia xacriabá
seu caboclo d'água sentado na pedro do segredo
seu delírio sua febre seu desvario
Descamba o rio
em vilas cidades em terras jequitinhonhas
descendo a pedra redonda do Sêrro do Frio
para banhar o vale encantado da infância perdida
em terras de Araçuaí
em terras almenaras
em veredas de Itinga Salto Grande Pedra Verde Guarani
para despencar em terras baixas onde é chamado rio de areia
O rio agora é rio de areia
e persegue o mar
sonha o sal do oceano
para desmanchar-se em lume
agora o rio entre sem licença sem peia
ancho de água e barro
enchente
é o teu nome
que derruba casas
devora terras
doura a sede
despista a fome
o rio agora é fúria
o rio agora é raiva
insano menstruo de sangue e lama
o rio agora é mar
e banha jacintos de chuva
itiras retirantes
diamantinas de luares sobre o espelho d'água do rio
o rio agora é mar
e acaba de invadir Itapebi
muita gente perdendo casas
perdendo vidas
perdendo a alma
só a lama e as cobras perduram neste sertão de sol ardente
um rio é feito de outros rios
para entregar-se a um só mar
o mar de Netunho e Janaína
o mar de Colombo e Vespúcio
descamba
o rio em seu delírio sua febre seu desvario
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
ATÉ A ROSA ADORMECIDA DA METÁFORA
Youssef Rzouga
Dá-me-me a tua mão
é exatamente o quero
tu sabes o quanto
te quero
mas se te fazes obscura
de uma maneira
ou de outra
não te quero mais
Diga-me se é possível
apagar tudo
e começar do zero
convencer o vampiro
a fazer o impossível
para tornar-se belo
como um sol
lançar um desejo atroz
ao espaço
e colher estrelas e flores
ao largo do rio
Diga-me se é possível
jogar-se num mar escuro
e nadando escrever como um peixe
rebelde
cheio de emoção
como um arco-íris
que se expande pelo universo
inteiro
Diga-me se é possível
reciclar os resíduos
das grandes cidades
e injetar a essência
do jasmim em um
mapa fosforescente
Diga-me se é possível
partir uma maçã
pela metade
se é possível
falar mais forte
contar tudo com
mais detalhes
Se é possível
filtrar a rua
e reunir todas
as pessoas numa
praça de bondade
Dá-me a tua mão
é hora de correr
até a rosa adormecida
da metáfora
tradução/espanhol/lilian reinhardt
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