UMA EXPERIMENTAÇÃO POÉTICA DE LUZES DA TUA LUZ DA TUA PALAVRA DA TUA VOZ SOMANDO-SE MULTIPLICANDO-SE NA ILUMINAÇÃO DA GRANDE PIRA. POESIA SEMPRE ACESA NA ESCURIDÃO!
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
AMOR E SOLIDÃO
pintura/Van Gogh
Iratiense Joel Gomes Teixeira
As chamas crepitavam no fogão de barro e na panelinha preta e amassada borbulhavam os grãos de feijão entornados em caldo grosso.Pendurados numa ripa a rodela de linguiça e um manto de touçinho envolviam-se na fumaça que se erguia da lenha de bracatinga.
Tarde fria de outono...Sentado à boca do fogão,o velhinho era a personificação do abandono vivendo a solidão do fim do dia,naquela hora em que o céu aquieta-se entristecido e retornam caladas as últimas curucacas.
O olhar passeando pelas tábuas encardidas da parede...Uma caneca pendurada ali,um guarda chuva velho acolá,uma latinha de azeite de onde levanta-se em riste uma "espada de São Jorge"...Tudo tão familiar,tudo melancólico e vazio.Num dos cantos o quadro emoldurado...O casal!...Ela trazendo os cabelos presos,é jóvem ainda,e preserva aquêle ar de riso caboclo,acabrunhado,de quem fêz pôse ao retratista.O jóvem ao seu lado,tem os cabelos bem penteados,um bigode vistoso e um ar de felicidade.
Seus olhos,estáticos agora,sorvem aquêle retrato com a saudade de seus melhores dias.O casebre era o mesmo.Pobre em suas formas,acabrunhado em seus pertences...Rico em vivências! A jóvem senhora do retrato percorria os espaços com seus detalhes femininos,as flores brotavam ao redor das janelas e o feijão entornado em caldo grosso era servido à mesa como um autêntico manjar.
Um dia ela partiu e o casebre nunca mais foi o mesmo.O jasmineiro continuou a escorrer seus cheiros pelos desvãos da cêrca , saudoso do tempo em que o casal cruzava alegre pelo portão de entrada.
Em busca de melhores condições de vida,foram-se os vizinhos e aos poucos a aldeia foi ficando vazia.O velhinho achou por bem permanecer ali.Quase ninguém lhe visita e êle,resignado,entre uma baforada e outra no palheiro,encontra agora no crepitar das chamas o calor que aqueçe-lhe a alma solitária.
À noite,seu olhar procura o céu.Vez e outra,uma estrela cadente entra pelas janelas abandonadas das casas da aldeia,e seu coração dispara!...Alguma coisa lhe diz que a môça do retrato retornou num feixe de luz...Adormece varado de constelações e quando brota um novo dia,tudo recomeça em seu casebre.
Iratiense Joel Gomes Teixeira
Publicado no Recanto das Letras em 14/09/2010
Código do texto: T2498501
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